O efeito do defeito - Maria
Parte 8
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À hora programada o despertador ligou o rádio. Era manhã.
"... electricas foram resolvidas esta madrugada, enquanto isso, as autoridades continuam as buscas pelo jovem Gaspar Fernandes, de quinze anos, que desaparecera esta noite durante o inexplicável apagão. Mais informações a seguir aos anúncios."
Maria esticou um braço e desligou o despertador. Permaneceu deitada, acordada, porém de olhos fechados. O seu pensamento estava vazio. A luz da manhã raiava pela janela do seu quarto. Imaginou certa noite. Candeeiros iluminam a avenida de cima a baixo. Ao fundo, do avesso, um carro balança capotado. Maria corre mas a sensação é a mesma: a de estar presa ao asfalto, sem se poder mover para a frente. Num piscar de olhos, Carolina está sob a frente do carro. O carro range em sons de metais e vidros. Maria levanta o carro como se fosse de brincar. Nada a emociona...
Um ligeiro sufoco fez Maria acordar novamente. Havia adormecido. Passaram cinco minutos apenas. Maria levantou-se e vestiu-se. Desceu até à cozinha.
- Bom dia - cumprimentou Bernardo, indiferente.
- Bom dia.
Bernardo havia saído a noite passada depois de um telefonema, segundo a mãe. Maria sentou-se à mesa, observando os movimentos de Bernardo. Tinha vestido a mesma roupa do dia anterior, o fato cinzento, que por norma, era a sua cor de roupa geral. Caracterizava-se como um homem estranho e sem vida própria.
- Bernardo...?
- Sim? - deu-lhe atenção imediata.
- Precisava de um favor seu.
- Força.
Maria relaxou.
- O Bernardo vai sair agora?
- Depende.
- Bem, é que não posso levar a Carolina comigo, por isso...
- Tudo bem - afirmou num tom como se tivessem mudado o assunto - Ela está a dormir.
Maria concordou. Tomou o seu leite enquanto olhava para ele, calmo e sem preocupações. Maria não conseguia perceber o que a sua mãe via naquele homem. Era tão reservado e misterioso.
- A tua mãe contou-me sobre uma mulher que veio cá a casa procurar-te... - Bernardo quebrou o olhar de Maria - e pediu-me que vos vigia-se.
Maria acenou com a cabeça.
- Posso saber onde vais?
- Ao Hospital - Maria respondeu indiferente.
Bernardo levantou-se e arrumou o seu prato e copo. Lavou as mãos e dirigiu-se para a sala.
- A tua mãe chega às 14 em ponto. Não te atrases.
Maria ficara um pouco indignada. Havia, por tanto, um babysitter em casa. Levantou-se e arrumou as suas coisas. Voltou ao quarto e preparou-se para sair o mais rápido possível. Carolina continuava a dormir. E como ela parecia um anjo a dormir. Desceu novamente.
- Volto já - informou a Bernardo.
Percorreu a rua até ao final e sentou-se na paragem de autocarros. Não havia esperado muito, um autocarro com o seu destino aproximava-se. "Espero que ela tenha respostas para mim", pensou, "Mas que perguntas terei eu?", reflectiu, "Ela é médica, acho que poderei confiar nela.", "Em quem mais poderei confiar também?", Maria baixou o olhar. O autocarro parou saindo metade dos passageiros. "E o Mateus? O que terá ele? Poderei perguntar-lhe sobre ele?...", Maria perdeu-se nos pensamentos, distraiu-se.
À entrada do Hospital, Maria começou a sentir o nervosismo aumentar.
- Olá - chamou a recepcionista.
- Olá, eu gostaria de falar com uma médica que trabalha neste Hospital.
- Creio que não seja possível, isso. Estamos na hora de trabalho.
- Preciso muito de falar com ela - Maria pausou - Foi ela quem me recomendou vir aqui.
- Sendo assim - interrogou-se - Quem é a médica?
- Doutora Célia...
- Sim?
Maria voltou-se.
- Maria? Prazer em rever-te - sorriu Célia.
- Preciso de conversar consigo.
Célia mostrava-se atarefada entre dois pacientes à saída. Olhou o relógio e fez um sinal para a seguir.
- Deve ser importante, para teres mentido à recepcionista.
- Sim... - respondeu envergonhada, enquanto seguia a doutora pelo corredor até ao elevador.
Ao entrarem no escritório, Célia informou uma enfermeira de que faria uma pausa. Entrou de seguida e assinalou uma cadeira para Maria.
- Senta-te. Como está a tua irmã?
- Saudável, agora.
- Não fazíamos ideia anteontem ou nem teríamos ido a tua casa. O que se passa?
- Bem... É um pouco sobre isso que lhe quero falar.
Maria observou atentamente todo o escritório em seu redor enquanto organizava as suas ideias.
- À minha mãe não lhe agradou muito a ideia de terem ido lá a nossa casa.
- Oh querida. A culpa foi toda minha. Desculpa-me. Devia ter percebido quando não fui bem-vinda.
- Peço desculpa, pelo meu pai também...
- Se te reconfortar, eu terei todo o gosto em falar com a tua mãe e explicar-lhe a situação.
- Não acho que seja necessário - Maria acenou com a cabeça - Ela é um pouco exaltada. O melhor será esquecermos isto.
- Tudo bem - Célia sorriu - Mas não foi por isso que cá viste, pois não?
Maria baixou os olhos. Respirou fundo e suspirou calmamente.
- Ficaste confusa com o que aconteceu com o meu filho, Mateus? Desculpa-me.
- Sim - Maria elevou os olhos - Um pouco - e corou.
- Eu poderia contar-te o que se passa com o meu filho, mas tornaria ainda tudo mais confuso para ti.
Maria hesitou ao falar. Porém, Célia continuou.
- O Mateus tem um problema de memória, apenas. Foi instinto meu levá-lo até ti para poder ajudá-lo. Não queria ter arranjado problemas para ti.
- Nenhum. Mas o que eu tenho haver com isso? - perguntou gentilmente.
- Não sabemos com toda a certeza. E eu sei que para ti é estranho isso. Para mim também era ao início.
O telefone tocou.
- Dás-me um minuto? - pediu Célia - Sim, Mateus? ... O quê? Isso porque ela está aqui comigo... Como?... Calma, filho, vem ter comigo e contas-me. Tem cuidado. Beijo.
O telefone desligou. Célia reflectiu.
- Era o meu filho. Ele esteve em tua casa, mas tu não estavas.
Maria observou a forma como a doutora estava em pânico por dentro. Interrogou-se. "Porque iria ele procurar-me? O que se passa?"
- Acho que devo ir embora - levantou-se Maria.
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À hora programada o despertador ligou o rádio. Era manhã.
"... electricas foram resolvidas esta madrugada, enquanto isso, as autoridades continuam as buscas pelo jovem Gaspar Fernandes, de quinze anos, que desaparecera esta noite durante o inexplicável apagão. Mais informações a seguir aos anúncios."
Maria esticou um braço e desligou o despertador. Permaneceu deitada, acordada, porém de olhos fechados. O seu pensamento estava vazio. A luz da manhã raiava pela janela do seu quarto. Imaginou certa noite. Candeeiros iluminam a avenida de cima a baixo. Ao fundo, do avesso, um carro balança capotado. Maria corre mas a sensação é a mesma: a de estar presa ao asfalto, sem se poder mover para a frente. Num piscar de olhos, Carolina está sob a frente do carro. O carro range em sons de metais e vidros. Maria levanta o carro como se fosse de brincar. Nada a emociona...
Um ligeiro sufoco fez Maria acordar novamente. Havia adormecido. Passaram cinco minutos apenas. Maria levantou-se e vestiu-se. Desceu até à cozinha.
- Bom dia - cumprimentou Bernardo, indiferente.
- Bom dia.
Bernardo havia saído a noite passada depois de um telefonema, segundo a mãe. Maria sentou-se à mesa, observando os movimentos de Bernardo. Tinha vestido a mesma roupa do dia anterior, o fato cinzento, que por norma, era a sua cor de roupa geral. Caracterizava-se como um homem estranho e sem vida própria.
- Bernardo...?
- Sim? - deu-lhe atenção imediata.
- Precisava de um favor seu.
- Força.
Maria relaxou.
- O Bernardo vai sair agora?
- Depende.
- Bem, é que não posso levar a Carolina comigo, por isso...
- Tudo bem - afirmou num tom como se tivessem mudado o assunto - Ela está a dormir.
Maria concordou. Tomou o seu leite enquanto olhava para ele, calmo e sem preocupações. Maria não conseguia perceber o que a sua mãe via naquele homem. Era tão reservado e misterioso.
- A tua mãe contou-me sobre uma mulher que veio cá a casa procurar-te... - Bernardo quebrou o olhar de Maria - e pediu-me que vos vigia-se.
Maria acenou com a cabeça.
- Posso saber onde vais?
- Ao Hospital - Maria respondeu indiferente.
Bernardo levantou-se e arrumou o seu prato e copo. Lavou as mãos e dirigiu-se para a sala.
- A tua mãe chega às 14 em ponto. Não te atrases.
Maria ficara um pouco indignada. Havia, por tanto, um babysitter em casa. Levantou-se e arrumou as suas coisas. Voltou ao quarto e preparou-se para sair o mais rápido possível. Carolina continuava a dormir. E como ela parecia um anjo a dormir. Desceu novamente.
- Volto já - informou a Bernardo.
Percorreu a rua até ao final e sentou-se na paragem de autocarros. Não havia esperado muito, um autocarro com o seu destino aproximava-se. "Espero que ela tenha respostas para mim", pensou, "Mas que perguntas terei eu?", reflectiu, "Ela é médica, acho que poderei confiar nela.", "Em quem mais poderei confiar também?", Maria baixou o olhar. O autocarro parou saindo metade dos passageiros. "E o Mateus? O que terá ele? Poderei perguntar-lhe sobre ele?...", Maria perdeu-se nos pensamentos, distraiu-se.
À entrada do Hospital, Maria começou a sentir o nervosismo aumentar.
- Olá - chamou a recepcionista.
- Olá, eu gostaria de falar com uma médica que trabalha neste Hospital.
- Creio que não seja possível, isso. Estamos na hora de trabalho.
- Preciso muito de falar com ela - Maria pausou - Foi ela quem me recomendou vir aqui.
- Sendo assim - interrogou-se - Quem é a médica?
- Doutora Célia...
- Sim?
Maria voltou-se.
- Maria? Prazer em rever-te - sorriu Célia.
- Preciso de conversar consigo.
Célia mostrava-se atarefada entre dois pacientes à saída. Olhou o relógio e fez um sinal para a seguir.
- Deve ser importante, para teres mentido à recepcionista.
- Sim... - respondeu envergonhada, enquanto seguia a doutora pelo corredor até ao elevador.
Ao entrarem no escritório, Célia informou uma enfermeira de que faria uma pausa. Entrou de seguida e assinalou uma cadeira para Maria.
- Senta-te. Como está a tua irmã?
- Saudável, agora.
- Não fazíamos ideia anteontem ou nem teríamos ido a tua casa. O que se passa?
- Bem... É um pouco sobre isso que lhe quero falar.
Maria observou atentamente todo o escritório em seu redor enquanto organizava as suas ideias.
- À minha mãe não lhe agradou muito a ideia de terem ido lá a nossa casa.
- Oh querida. A culpa foi toda minha. Desculpa-me. Devia ter percebido quando não fui bem-vinda.
- Peço desculpa, pelo meu pai também...
- Se te reconfortar, eu terei todo o gosto em falar com a tua mãe e explicar-lhe a situação.
- Não acho que seja necessário - Maria acenou com a cabeça - Ela é um pouco exaltada. O melhor será esquecermos isto.
- Tudo bem - Célia sorriu - Mas não foi por isso que cá viste, pois não?
Maria baixou os olhos. Respirou fundo e suspirou calmamente.
- Ficaste confusa com o que aconteceu com o meu filho, Mateus? Desculpa-me.
- Sim - Maria elevou os olhos - Um pouco - e corou.
- Eu poderia contar-te o que se passa com o meu filho, mas tornaria ainda tudo mais confuso para ti.
Maria hesitou ao falar. Porém, Célia continuou.
- O Mateus tem um problema de memória, apenas. Foi instinto meu levá-lo até ti para poder ajudá-lo. Não queria ter arranjado problemas para ti.
- Nenhum. Mas o que eu tenho haver com isso? - perguntou gentilmente.
- Não sabemos com toda a certeza. E eu sei que para ti é estranho isso. Para mim também era ao início.
O telefone tocou.
- Dás-me um minuto? - pediu Célia - Sim, Mateus? ... O quê? Isso porque ela está aqui comigo... Como?... Calma, filho, vem ter comigo e contas-me. Tem cuidado. Beijo.
O telefone desligou. Célia reflectiu.
- Era o meu filho. Ele esteve em tua casa, mas tu não estavas.
Maria observou a forma como a doutora estava em pânico por dentro. Interrogou-se. "Porque iria ele procurar-me? O que se passa?"
- Acho que devo ir embora - levantou-se Maria.
Criado por Unknown
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